Que importa, oh Sanches, que hajas escrutado
Do Numen de Epidauro altos segredos
Se has-de toccar (um pouco mais tardîo)
A meta inevitável?

Em vão, co'a luz do Hypocrates moderno
No sanctuario entraste da Natura;
A segadoura foice não se embota
Com morredoras hervas.

Filinto Elísio
Ode ao Senhor Doutor António Ribeiro Sanches

BIOGRAFIA

1699 - Nasce António Nunes Ribeiro Sanches, a 7 de Março, na pequena vila de Penamacor, na região da Beira Baixa. Seus pais, Simão Nunes e Ana Ribeiro, são uma família de cristãos-novos.
A 17 de Março, Ribeiro Sanches é baptizado pelo padre Domingos Mendes, cura da freguesia. Seus padrinhos foram António Henriques e Maria Nunes, esta última possivelmente a avó materna.


1712 - Com 13 anos é enviado pelo pai para a Guarda, para casa de uns familiares, onde se mantém até à ida para Coimbra. Aqui aprende a tocar cítara.
Foi, também, por esta altura que conviveu com o erudito Martinho de Mendonça de Pina e Proença a quem deve a inclinação para as letras.

1716 - Parte para Coimbra para cursar os estudos. Primeiro matricula-se no Colégio das Artes, dirigido pelos jesuítas. Aqui teve por professor o padre Manuel Baptista, da Companhia de Jesus, a quem anos depois dava demonstração de quanto lhe era reconhecido pela aprendizagem de filosofia. Segue-se depois o curso de Direito Civil, na Universidade de Coimbra.

1720 - Abandona Coimbra, tecendo várias críticas ao ensino aí ministrado e à vida boémia dos estudantes daquele tempo, e ingressa na Universidade de Salamanca. A primeira matrícula que se encontra em Salamanca do médico português é de 28 de Novembro de 1720 e essa matrícula é na Faculdade de Medicina, cursando também neste ano Artes. No ano seguinte, a 17 de Dezembro, encontramos o nosso compatriota a estudar Medicina. Esta matrícula repete-se a 15 de Dezembro de 1722 e em 20 de Dezembro de 1723.
As férias, essas, eram passadas na Guarda e, ao invés de descansar e aproveitar a boa vida, o eminente médico aprendia e praticava medicina com o Drº Bernardo Lopes de Pinho.

1724 - A 5 de Abril conclui Ribeiro Sanches a licenciatura em Medicina. Apesar de ter recebido uma oferta para ficar a leccionar na Faculdade de Medicina de Salamanca, Ribeiro Sanches opta antes pelo lugar de médico em Benavente onde permanece durante dois anos.

1726 - Denúncia de Manuel Nunes Sanches, seu primo, à Inquisição. Alegava tê-lo encontrado na Guarda em 1722, em casa de uma tia paterna, de nome Leonor Mendes. O delator afirmava que todos eles, incluindo Sanches, se entregavam às práticas judaicas.
A curiosidade científica e o receio de ser alvejado pelas perseguições religiosas, de que a sua família tinha sido vítima quase ininterruptamente durante vinte anos, leva-o a abandonar Portugal.
Antes, porém, de partir, o ilustre médico escreve a sua primeira obra intitulada Discurso sobre as Águas de Penha Garcia, hoje conhecidas por Termas de Monfortinho. Nesta obra Ribeiro Sanches ressalta o poder terapêutico da milagrosa água, ao mesmo tempo que contribui para que mais gente se desloque a esta zona do interior centro do país.
Saída definitiva de Portugal com rumo à capital da Inglaterra.

1727 - Encontra-se a residir em Londres na casa do seu tio e protector Diogo Nunes Ribeiro. Aqui abraçou confessadamente a lei de Moisés e o culto da sinagoga a tal ponto que decidiu submeter-se à circuncisão. Em Londres frequenta escolas e hospitais e entrega-se de alma e coração ao estudo de várias áreas, entre elas as matemáticas (física, química, ciências naturais, farmácia). Fica deslumbrado com o ensino ali ministrado e entende que em nenhuma parte se podia aprender Química a não ser na Inglaterra, para onde desejava que fossem mandados alunos portugueses a estudá-la. A mesma opinião tinha em relação à Farmácia Química. Admirava, igualmente, o ensino prático que aqui se fazia da Física. Tal era a consideração que tinha pela ciência inglesa que no Tratado da Conservação da Saúde dos Povos faz menção aos seus grandes higienistas.
Nos dois anos que passou em terras de Sua Majestade ter-se-á relacionado com Jacob de Castro Sarmento, também ele médico de origem judaica, que desde 1721 se tinha fixado na capital inglesa onde foi membro do Colégio Real dos Médicos de Londres, sócio da Royal Society e membro do corpo docente da Universidade de Aberdeen, na Escócia.

1728 - Visita a Universidade de Montpellier, passando por Paris e Marselha. Em Montpellier conhece o famoso médico João Baptista Bertrand que ali se fixara e que exerce grande influência na vida de Ribeiro Sanches, aconselhando-o a ir para Leyde ouvir as lições de Boerhaave. A partir dos ensinamentos de Bertrand toma conhecimento de algumas particularidades respeitantes à terrível doença que assolava a Europa - a Peste. Com o intuito de se instruir sobre a matéria, Sanches percorre os lugares onde o flagelo tomara maiores proporsões.
Segue viagem para Bordéus na companhia do irmão e ali encontra algum auxílio na família de um antigo discípulo de Latim e História. Por estas paragens demora-se algum tempo até que se transfere para Leorne "para ver se tinha alguma conveniência pela Medicina"(1). Por essa ocasião visita a Universidade de Pisa. Aqui conhece o Padre João Alberto de Soria, lente de filosofia que depois volta a encontrar em Leorne. Este homem teve um papel importante na reconversão de Sanches, embora, nesta altura, as suas crenças judaicas estivessem já muito abaladas.

1729 - Chegada de Ribeiro Sanches a Bordéus. A sua permanência em Itália fê-lo pensar na sua condição religosa. Se na prática ainda não abraçara a nova religião na consciência trazia já a fé cristã.
Encontro do médico português com o irmão, Manuel Sanches, a quem confessa a sua reconversão religiosa, acabando por influenciá-lo também a renunciar ao judaísmo.

1730 - Chegada do nosso compatriota a Leyde onde passou aproximadamente dois anos da sua vida. Sanches conservou sempre de Leyde a impressão de que era a mais profícua de todas as universidades. Aqui conhece muitos intelectuais e teve o privilégio de receber as lições do grande médico e professor Boerhaave elogiando-lhe a excelência do seu ensino. Numa das cartas a Sampaio Valadares afirma que "e eu em dois annos que estive em Leyde aprendi mais com dois professores Boerhaave e Albinus do que aprendi depois de 20 annos"(2).
Em Leyde não vive como judeu, cuja fé havia já renunciado, mas também não ia publicamente à missa com receio que os judeus que o sustentavam lhe negassem recursos. Ao ministro na Haya, D. Luiz da Cunha, que ia visitar com frequência, confidenciava a sua rejeição ao judaísmo.
Começa a redigir o manuscrito Origem da denominação de christão velho e christão novo no reino de Portugal e as causas da continuação destes nomes como também da cegueira judaica. O trabalho tinha em vista a extinção entre cristãos novos e cristãos velhos e evitar o expatriamento de pessoas laboriosas e ricas, receosas das perseguições inquisitoriais.

1731 - A imperatriz russa Ana Ivanovna escreve a Boerhaave pedindo-lhe que lhe envie os três melhores alunos da Universidade para os seus serviços. A escolha recai sobre o afamado médico português que, mercê das circunstâncias, foi obrigado a revelar ao seu mestre que já era médico. Quis Boerhaave reembolsar o seu discípulo das matrículas pagas, ao que este se opôs, objectando que aprendera mais em Leyde do que em vinte anos na sua pátria.
Ribeiro Sanches viaja para a Rússia em Outubro deste ano onde é colocado em Moscovo como médico do Senado e da cidade. Antes, ao passar pela Lorena, nota o grande desenvolvimento que ali tomara a agricultura.
Logo que chega começa a adquirir consideração como sábio e a conquistar a confiança de grande número de doentes. Fica de tal forma impressionado com a prática dos banhos russos que escreve uma obra intitulada Dissertação sobre os banhos a vapor da Rússia. Ele via nos famosos banhos russos um meio universal de tratamento de doenças, quando não era possível o acesso a outros tratamentos, e recomendou-os aos seus leitores ocidentais.
Começa a redigir a obra Origem da denominação de Christão velho e Christão novo que conclui em 1735.

1733 - Rieger, 1º médico da imperatriz e presidente da Chancelaria de Medicina, chama-o para S. Petersburgo.

1734 - Rieger nomeia-o membro da Chancelaria de Medicina.

1735 - É nomeado médico dos exércitos imperiais, cargo que aceita com satisfação, porque lhe permitiria estudar as doenças dos acampamentos e fazer algumas observações sobre os hospitais militares. Neste ano escreve duas cartas ao seu amigo Sampaio Valadares, o destinatário das suas confissões. Numa dessas cartas afirma que não tinha intenção de regressar a Portugal, principalmente por causa da Inquisição, mas se fosse possível "estou prompto para partir, no caso que possa fazer bem à pátria, que doutro modo não o desejo"(3).
Acompanha o exército na guerra contra a Turquia, o que lhe trouxe a possibilidade de percorrer vários países e contactar com outros povos.
Escreve uma carta a Sampaio Valadares dando conta do abandono do judaísmo e a devoção ao cristianismo católico romano.

1736 - É vitimado por uma febre maligna aquando do cerco de Azoff, perpetrado pelos russos. É roubado, tendo sido levadas as suas malas, o dinheiro e os papéis em que anotara as observações que diariamente fazia. Estes preciosos documentos foram, aliás, a única perda que lamentou profundamente porque esses diários clínicos continham informações preciosas sobre as desinterias e febres remitentes que dizimaram um terço do exército russo. A sua passagem pelos hospitais militares dá-lhe a possibilidade de estudar minuciosamente as mortíferas doenças que vitimaram alguns dos soldados (febres pestilentas e escorbuto) que poucos colegas conheciam como ele, porque não só as tratara como médico, mas as sofrera como doente.
Depois de regressar da campanha, em Outono de 1736, a Imperatriz nomeia-o médico do nobre corpo dos cadetes. A sua estima pelo médico português era tanta que chama-o para tratar os nobres que mais de perto estimava. Apesar da sua intensa actividade médica ainda tinha tempo para manter correspondência com muitos sábios da Europa, como Gunz, Haller, e interessar-se por outra ciências.
Dá início a alguns manuscritos, entre eles, a Materia Medica em que lançava o que encontrava de valioso nas obras de Boerhaave, Van Swieten João Boecler, John Quincy, Friedrich Hoffmann e Plínio. A obra acabou por ficar incompleta.
Redige a Praxis Medica Interna em que se encontram notas clínicas diversas, resultado das suas leituras e observações do dia-a-dia.
A 20 de Dezembro começa outra colecção intitulada Versurae phisicae (morbosae), chemicae, physiologicae et historiae naturalis, anatomiae, composta, essencialmente, por observações anatomo-patológicas colhidas em Ruysch. Sanches dá neste manuscrito demonstração de verdadeiro espírito científico.

1737 - Começa a redigir um trabalho de semiótica intitulado Adversaria de prognosticis et diagnosticis in Hippocrat. O seu conteúdo é composto pela enumeração dos diferentes sintomas e as doenças a que correspondem, bem como o valor que têm para o prognóstico. Na segunda parte do trabalho faz algumas observações médicas sobre as doenças do aparelho respiratório.

1738 - Inicia, a 10 de Março, o seu Manuale practicum in usos domesticos conccinatum et per symptomate et causas morborum et therapeiam digestum tam acutorum quam diuturnorum morborum, considerado um pequeno trabalho de semiótica sem grande valor.
Começa a redigir a famosa obra Dissertação sobre as Paixões da Alma, propondo fazer uma teorização sobre as emoções e os comportamentos patológicos a estes associados através não só da sua própria experiência como médico, mas servindo-se da experiência alheia.
Manuel Sanches, seu irmão, defende, a 21 de Julho, em Leyde a tese para a sua formatura em medicina com o título De gangrena.
Morre, na Holanda, o seu grande mestre Boerhaave a quem a Medicina, a Química e a Botânica Médicas ficaram devendo grandes progressos.

1739 - Escreve novos manuscritos contendo observações médicas suas e alheias, fruto das relações amigáveis que mantinha com diversos sábios europeus. De destacar Günz, prestigiado anatómico e Schreiber, famoso médico alemão.
Manuel Sanches viaja para Nápoles onde passou toda a vida, exercendo a profissão de médico militar.

1740 - António Ribeiro Sanches é nomeado médico da Corte, constituindo a sua primeira consulta um êxito retumbante. A este cargo correspondia um ordenado de 2000 rublos além de moradia, alimentação, carruagem, etc., tudo avaliado em 500 rublos.
Falecimento da imperatriz Ana Ivanovna. Esta andava doente havia oito anos e ninguém sabia a causa da enfermidade. Ribeiro Sanches diagnostica calculose renal, que foi confirmada na autópsia, quando passados seis meses se dava a morte da Imperatriz.
Instala-se uma profunda crise de sucessão na Rússia, mas Sanches foi ainda nomeado primeiro médico da regente e de seu filho Ivan.

1741 - Estala a revolução que leva ao trono Isabel Petrovna, filha de Pedro o Grande, verdadeiramente anti-judaízante. A situação do ilustre sábio complica-se, mas, no entanto, não abandona as actividades científicas e clínicas e os seus méritos como médico famoso não o deixam furtar-se a ser chamado para tratar doentes graves, tais como o futuro Pedro III, passando 30 noites à sua cabeceira e curando-o.
Escreve o manuscrito Prudentia in aula: video et tacco.

1744 - A princesa Sophia Augusta cai doente sendo salva pelo médico português, o mesmo acontece com a futura imperatriz Catarina II, a qual declara nas suas Memórias que Ribeiro Sanches lhe salvara a vida. Em resultado de todos estes êxitos foi nomeado Conselheiro de Estado.

1747 - A 4 de Setembro consegue, finalmente, a tão desejada exoneração, em parte, graças aos protectores famosos que ainda intercediam em seu favor. Por ocasião da sua partida, a 12 de Setembro, do corrente ano, a Academia Imperial das Ciências de S. Petersburgo nomeia-o sócio externo, o que traduzia não só o apreço em que o tinha, mas até certo ponto um protesto contra a violência de que era alvo.
Depois de assinado o seu decreto de exoneração, Sanches deixa a Rússia e ruma a Paris onde chega no fim deste ano, mas antes passa por Berlim onde foi recebido pelo grande Frederico da Prússia, ansioso por saber o que se passava na administração russa. Porém, Sanches consegue iludir a curiosidade do soberano, falando-lhe apenas de História Natural e Física.
Atravessa a Lorena onde admira, novamente, a fertilidade da região e o desenvolvimento da agricultura.
Chegado finalmente a Paris, o grande centro de actividade intelectual, Ribeiro Sanches estava agora confinado à sua própria sorte. Longe do país que tão dedicamente servira e da pátria que o esquecera, a França, onde não tinha relações nem protectores, acabava por se afigurar um sítio completamente estranho. O diplomata D. Luís da Cunha era o único amigo que conhecia, mas em breve o havia de perder. O amor exacerbado pelas ciências foi o factor determinante para a sua permanência até ao fim da vida. Em Paris conseguiu chamar a atenção de muitos intelectuais franceses da época: Camillo Falconet, D'Alembert, Buffon, Diderot, Valart, Daubenton, Lavirote, entre outros. Vive como um verdadeiro filósofo. Só vê os seus amigos compatriotas, os russos e os pobres. Aos poucos vai-se afastando da profissão de médico e recolhendo-se na intimidade dos livros - redigindo notas sobre as observações que fizera por todos os locais por onde passara.
Os assuntos dos seus escritos falavam de medicina, economia, religião e tudo o que o seu vasto espírito abrangia. O seu objectivo era promover reformas no país adoptivo (Rússia) e na sua terra natal tão separados pela distância, mas tão semelhantes na ignorância e na superstição.

1750 - Finaliza a obra que rebate a tese de que a sífilis é proveniente da América. O escrito tem por título Dissertação sobre a origem da doença venérea, e, para além de numerosas edições, teve também o privilégio de ser traduzido em inglês e alemão.
Por esta altura Ribeiro Sanches é eleito membro da Sociedade Real de Londres.

1753 - Termina a obra Dissertação sobre as paixões da alma, interessante trabalho sobre a influência das emoções na patologia.

1755 - Conclusão do Tratado da Conservação da Saúde dos Povos. Esta obra, escrita por um dos maiores higienistas portugueses, é o primeiro Tratado de Higiene redigido em vernáculo.

1758 - O governo português, preocupado com a renovação do ensino, pediu a Sanches que elaborasse um plano de reforma dos estudos médicos. Para tal apresenta um manuscrito intitulado Método de aprender a estudar medicina, que foi aprovado nas suas linhas gerais. A sua proposta defendia a ida dos alunos aos centros mais cultos da Europa para aperfeiçoarem-se, a importância de se estabelecer uma escola geral e real de medicina, as formas como esta ciência devia ser ensinada e aprendida e como se deveria estabelecer os exames e graus académicos.

1759 - Publicação em Paris das obras de Luis de Camões pelo editor Pedro Gendron. Sanches tem a honra de colaborar nesta edição.
A Coroa portuguesa atribui a Ribeiro Sanches uma tença como remuneração às várias propostas que apresentou para a completa renovação e reforma do sistema educacional em Portugal, assim como para um melhor ensino da medicina e cirurgia. Essa pensão seria, posteriormente, interrompida em Julho de 1761, mas é renovada em Agosto de 1769 e, daí em diante, paga com mais ou menos regularidade até ao fim da sua vida.
Escreve o seu mais importante trabalho sobre pedagogia, intitulado Cartas sobre a Educação da Mocidade, datadas de Paris de 19 de Dezembro ainda que tivessem saído em 1760 com a designação de Colónia. Trata-se de um verdadeiro contributo para a reforma pedagógica. Nestas Cartas Ribeiro Sanches pugna pela doutrina da secularização do ensino, e que deu os seus frutos já que resultou na criação do Colégio dos Nobres.

1761 - Ultima a primeira parte do seu Método para aprender e estudar a Medicina que datou de Paris, 26 de Março, mas que só se imprimiu em 1763 ilustrado com os Apontamentos para fundar-se uma Universidade Real na qual deviam aprender-se as Ciências Humanas de que necessita o Estado.

1762 - Catarina II, imperatriz da Rússia, que tinha sido salva por Ribeiro Sanches, de uma doença que a vitimou, resolve conceder-lhe uma mensalidade, como sinal da sua gratidão e admiração, que seria mantida até à sua morte.
Vê-se envolto numa questão problemática sobre a invenção do medicamento da cura da sífilis que na altura era atribuída, erróneamente, a Van Swieten. Sanches através de uma carta esclarece que tomou conhecimento do milagroso corrosivo através de um cirurgião alemão que vivera na Sibéria, país onde o medicamento era empregue para combater a doença. Só que nunca lhe comunicou a dose certa para surtir o efeito pretendido. Sanches, então, decidiu fazer experiências para fixar a dose do medicamento tendo solucionado o mistério. Através de algumas cartas de Van Swieten, Sanches demonstrou que não se devia a ambos a invenção do emprego interno do sublimado para curar as doenças venéreas, mas que fora um cirurgião da Sibéria que o informara.

1763 - É apresentada a sua proposta de reforma para o ensino médico e dela é aproveitada os temas referentes à parte prática do curso de Medicina, como a criação de um Jardim Botânico, Teatro Anatómico, Farmácia, Hospital, etc.
Encontra-se concluído o trabalho Apontamentos para estabelecer-se um tribunal e colégio de Medicina, defendendo nele a criação de um tribunal que tivesse a seu cargo a inspecção e direcção do exercício da medicina e a colocação de médicos nos diferentes partidos.

1765 - É publicada a terceira edição da sua Dissertation sur la maladie vénérienne.

1766 - A ânsia de ver o seu país reorganizado leva-o a escrever um pequeno trabalho que leva por título Sobre a inibição de se tomarem graus na faculdade de Cânones. Apesar de não ter a intenção de pensar jamais em Portugal, o seu amor pela pátria fala mais alto e não consegue deixar de colocar no papel as circunstâncias penosas em que o reino se encontra.

1768 - Dá início ao seu Journal, manuscrito de valor auto-biográfico incalculável, espécie de Diário onde anotava tudo o que tinha interesse, ao lado das cartas que enviava e recebia, as leituras que fizera, as suas preocupações, etc.

1771 - É publicado na famosa Enciclopédia de Diderot e D'Alembert o artigo Maladie vénérienne inflamatoire chronique. Ribeiro Sanches foi o único intelectual português a ter o privilégio de constar da famosa enciclopédia.
Finaliza um trabalho valioso com o título de Pecúlio de várias receitas para diversas queixas. Neste manuscrito emergem diversos assuntos, desde memórias sobre a sífilis, conselhos para o exercício da cirurgia até um tratado de patologia eterna e demais assuntos.

1772 - Sai o último volume dos seus Comentários sobre Boerhaave.
As vantagens e desvantagens dos hospitais para a cura das doenças foi outro dos assuntos a que se dedicou e constituiu a base para a redacção do manuscrito Origine des Hôpitaux, datado de 10 de Junho.

1776 - Termina o seu trabalho Observações sobre doenças venéreas considerada a obra mais importante sobre sifiligrafia, publicada postumamente. Nela demonstra que muitas doenças crónicas e lesões encontradas na autópsia, eram devidas à sífilis.Contudo, a parte mais importante da obra prende-se com a heredosífilis, descrevendo muitas das suas múltiplas e variadas manifestações.

1778 - É nomeado sócio estrangeiro da Sociedade Real de Medicina em Julho deste ano.

1779 - Escreve a obra Mémoire sur les Bains de Vapeur de Russie. Descreve nesta memória os banhos russos e compara-os com os dos gregos e romanos. Menciona as suas vantagens, não só para fins higiénicos mas para combater determinadas doenças.
É nomeado sócio correspondente da Academia Real das Ciências de Lisboa quando já contava 80 anos de idade.
É lida, a 5 de Outubro, na Sociedade Real de Medicina de Paris a sua Mémoire sur les bains de vapeur de Russie.

1780 - A 25 de Outubro Ribeiro Sanches adoece inesperadamente, não lhe sendo dadas esperanças de vida. Mas, apesar da idade avançada, o médico português consegue vencer a enfermidade, um contentamento que não havia de durar muito tempo.

1782 - O sábio português volta a adoecer em Novembro deste ano. Os médicos mostram-se pouco confiantes quanto a possíveis melhoras.

1783 - Morte de António Ribeiro Sanches, a 14 de Outubro, considerado o maior médico português do século XVIII. Foi enterrado numa cova particular no cemitério da Igreja de S. João em Grève. Devido à extinção do cemitério o seus restos mortais foram trasladados para as catacumbas de Paris.
Ignorado pelos seus próprios compatriotas, ainda assim, Ribeiro Sanches nunca esqueceu a pátria que o subestimara. O seu autêntico amor português traduziu-se nos inúmeros manuscritos e obras que escreveu, na tentativa de contribuir para uma mudança das mentalidades no Portugal arcaico e debilitado que chegou a chamar de Reino Cadaveroso por estar embrenhado num profundo marasmo científico e cultural.
Em Dezembro deste ano, a sua biblioteca é vendida em leilão. Rica em obras de carácter médico e de uma variedade apreciável de livros de outros ramos do saber esta extensa biblioteca contava ao todo 1113 títulos que versavam sobre Teologia, Jurisprudência, Ciência e Artes, Medicina, Cirurgia, Anatomia, Farmácia Química, Matemáticas, Artes, Belas Artes, Retórica, Poética, Crítica, Polígrafos, História, História Literária, Bibliografia e Extractos Históricos.


Notas

1 Maximiano Lemos, A sua Vida e a sua Obra, Porto, Ed. Eduardo Tavares Martins, 1911, p.82.

2 Idem, p.86.

3 Apud Maximiano Lemos, A sua Vida e a sua Obra, Porto, Ed. Eduardo Tavares Martins, 1911, p.113.

 

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